Uma guerra privada com armas públicas
Não há mocinhos em nenhum dos lados da recente briga entre a TV Globo e a Rede Record de Televisão. Também não há mentiras nos ataques de uma contra a outra: os Marinho sempre tiveram uma relação espúria com o poder e a Record, uma interação promíscua com a Igreja Universal do Reino de Deus. Mas o problema central nessa guerra é que estão guerreando com armas alheias. Estão guerreando com armas públicas.
Por Rodolfo Vianna em 18/8/2009 (Reproduzido do Observatório do Direito à Comunicação)
Não há mocinhos em nenhum dos lados da recente briga entre a TV Globo e a Rede Record de Televisão. Também não há mentiras nos ataques de uma contra a outra: os Marinho sempre tiveram uma relação espúria com o poder e a Record, uma interação promíscua com a Igreja Universal do Reino de Deus. Mas o problema central nessa guerra é que estão guerreando com armas alheias. Estão guerreando com armas públicas.
É ingenuidade de pouco eco crer que não existem interesses econômicos e ideológicos guiando os grandes grupos de comunicação do país. A comunicação de massa tem papel estratégico na organização social e criação de valores e a informação também sofre diversos tipos de manipulações, das mais explícitas – edições de texto/imagens, escolha das fontes, qualificações – às mais sutis – o que é silenciado, o "tom" sobre o informado, as relações de uma notícias com outra, a ordem de apresentação.
É por isso que a luta pela democratização da comunicação não se restringe à criação de normas de conduta ao jornalismo hoje praticado, buscando a isenção e objetividade. Essa luta tem de visar a possibilidade de multiplicação de vozes, a multiplicação do que é informado e como é informado, permitindo ao cidadão obter mais dados sobre uma determinada realidade para que, com eles, forme seu juízo. Com o monopólio ou oligopólio da informação, restringem-se as versões da realidade, orientando visões de mundo.
Amadorismo tacanho
Qual o problema, então, com a recente disputa entre a Rede Globo e a Rede Record? Esta última está expondo a milhões de telespectadores informações que antes só eram conhecidas de um grupo restrito sobre a tenebrosa história da maior emissora do país. A Globo, por sua vez, ataca o sistema nervoso da segunda maior emissora, os incontáveis problemas da Igreja Universal do Reino de Deus. O conflito quebra um tácito pacto de não agressão entre os poderosos, e mais informações são disponibilizadas ao público. Quando dois gigantes brigam, os pequenos podem tirar proveito, imagina-se.
Só que esta "guerra" escancara de uma forma sem precedentes uma prática ilegal e imoral: os interesses privados estão sendo defendidos com armas públicas, as concessões de TV entregues aos Marinho e a Edir Macedo. Ao lançarem mão destas "armas", comprometem a função social dos meios de comunicação e, mais, infringem normas de utilização de uma concessão pública de radiodifusão.
Diferentemente de um jornal impresso, que é privado e responde atualmente somente às leis dos códigos Civil e Penal (já que não existe mais a Lei de Imprensa...), as emissoras de televisão operam por meio de concessões públicas e, como tais, estão obrigadas a cumprir determinações legais para o seu funcionamento. Não podem fazer o que bem entender com a sua programação, uma vez que só possuem o direito de chegar aos lares de praticamente todos os brasileiros porque o Estado brasileiro, em nome do povo, as tornou concessionárias públicas de radiodifusão.
Portanto, não importa quem tem razão nessa guerra privada entre Globo e Record. As duas cometem um gravíssimo erro ao utilizar a arena pública da radiodifusão de forma privilegiada para travarem as batalhas privadas que lhes interessam. A Rede Globo, caminhando por mais anos nessa estrada, tem mais expertise. Seus interesses são mais bem travestidos de "notícias" relevantes apresentadas à sociedade nos seus telejornais. A Record peca por um amadorismo tacanho, com a edição de "reportagens" em que nem sequer se preocupam em fazer a clássica divisão da objetividade aparente entre "opinião" e "informação".
Mesmo lado
Mas não importa o nível de sofisticação de cada uma delas. A disputa Globo x Record é a mais recente e nítida apropriação do público pelo privado.
(leia a íntegra)
quarta-feira, 19 de agosto de 2009
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário